Era aqui que passava parte dos Verões quentes. Não tinha a praia do “Piranha” da série Verão azul, mas tinha ribeiras, rios. Não havia o barco do “Chanquete”, mas a nossa imaginação transformava os nossos chinelos em verdadeiros cruzeiros que deslizavam pela corrente da ribeira. Era assim.
A minha mãe preparava o piquenique, o meu pai trazia as cadeiras, a espreguiçadeira e ali ficávamos, os quatro, eu, a minha irmã, a minha mãe e o meu pai, estendidos na laje quente junto à ribeira da Cabras.
Havia silêncio, havia pássaros, rãs, libelinhas das quais eu fugia a sete pés, havia pessoas que nos visitavam junto à laje.
Passados tantos anos continua a haver silêncio, pássaros, rãs, mas as pessoas raramente ali vão e as libelinhas já não voam sobre as águas agora paradas e verdes da ribeira das Cabras.
Ali estávamos, os quatro, passados tantos anos, a ler, a dormir, a fazer croché, a recordar e a sentir o abandono, a pena do abandono de um lugar tão bonito e calmo.
Em Pinhel, cidade bicentenária, com uma imensa história, as pessoas entregam-se diariamente a uma rotina de abandono. O Portugal profundo já raramente encontra pessoas que se apaixonem por ele, que se passeiem por ele, que vivam ali. Fechadas em casa, presas à realidade de uma ficção, de uma novela, eis a suas ribeiras, eis os seus rios, eis os seus silêncios.
Não esqueço.
(Texto e imagem: Raquel Félix/ Portugalize.Me)