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Portugal, o super herói?

20 Fevereiro, 2014

ZE POVINHO ANTONIO_Portugalize.Me

Ontem, instalou-se em mim um certo e preciso descontentamento.

Li a carta do João Tordo a seu pai, Fernando Tordo. Tive várias reacções. Primeiro, fiquei de rastos. Segundo, tentei levantar-me mas o espírito não reagiu da melhor forma. Deixei-me estar. Hoje, tenho o fel ao rubro e o olhar que lanço sobre o nosso país está tingido pela presença de um negativo não revelado.

Retive uma frase da carta do João que, a meu ver, ilustra bem a forma como, por vezes, tapamos o sol com a peneira, como eloquentemente dizemos e afirmamos: “Portugal é bom, tem talento, potencial e coisa tal”… de como procuramos freneticamente as “boas notícias” que se dizem, escrevem e publicam por aí, como apenas e unicamente olhamos para um lado esquecendo-nos de tantos outros. Apreciamos as “fotografias” que nos mostram (uma fotografia é uma ampliação do negativo, logo uma interpretação, um lado, uma visão das coisas). Olhamos estas imagens cheios de torcicolos, sem ampliação própria. 

A frase é esta: Os nossos governantes têm-se preparado para anunciar, contentíssimos, que a crise acabou, esquecendo-se de dizer tudo o que acabou com ela.” 

Para que fique claro, sou apartidária mas não apolítica.

Diz-se que sim, que a tal crise está a chegar ao fim… até o “Financial Times” o escreve: “Portugal the surprise hero of eurozone growth as exports and tourism prosper”. Face a isto ficamos que nem cães com o rabo a dar a dar só porque alguém como o “Financial Times” nos chamou de heróis. Confesso que estas notícias não me “entram” porque no dia a dia não encontro o reflexo cristalino e pseudopositivista deste tipo de heroísmo! Soa a exagero. Encontro o esforço de um grande punhado de gente, sem dúvida que sim, falo delas aqui diariamente (tento), dos seus projectos, dos seus sonhos, conquistas e derrotas. Um importante punhado de gente real.

A tal crise dos números, do ajuste de contas entre o país e as siglas (FMI’s, TROIKA’s, UE’s…) até pode estar a chegar a um fim e olhamos para isto como tábua de salvação, como forma de aliviar a tensão, como indicador de que tudo está bem e no sítio mas, o sítio é outro. Será sempre outro porque há coisas que irão findar com ela, há coisas que já findaram. De que forma iremos lidar com isso? E  o ajuste de contas entre o país e os seus cidadãos. Quando terá fim?

Que super heroísmo é este?

(Texto: Raquel Félix/ Portugalize.Me/ Cartoon: António/ Expresso)