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Muitas das histórias que compõem o tecido cultural do nosso país, ficaram inscritas na memória de muitos portugueses, foram passadas de boca em boca e guardadas a sete chaves num recanto qualquer da mente. Para se ouvir uma história ou uma cantilena, reunia-se a família ou ia-se até à taberna mais próxima com os amigos (lugar onde o Cante Alentejano faz palco e ainda se expressa nos dias de hoje) e o ritual começava.

O contador partilhava perante todos uma lenga lenga, uma dor cantada, um acontecimento em rima, e assim, filhos e netos foram ensinados a ouvir e a passar esta herança de geração em geração. Muitas perderam-se, mas outras, ainda andam por aí, na boca de alguém.

Naquele tempo as barreiras de Babel existiam de forma mais acentuada. Nem todos sabiam ler e escrever, nem todos sabiam outras línguas mas, por outro lado, a tradição oral permitia que a comunicação, mesmo assim, fosse possível. Faziam-se gestos, desenhos no chão ou no ar com as mãos, deixava-se cair uma lágrima a determinada altura da história e o estrangeiro linguistico percebia que naquele momento a emoção tocara o coração e alma do contador de histórias e chorava também.

Naquele tempo os computadores não existiam. O primeiro computador pessoal foi lançado em 1981 e a internet, surgiu apenas dez anos depois como serviço público. Quem se dedicava à arte do dizer, nem sequer sonhava com tais coisas, a partilha era ali, ao vivo e a cores tendo como tecnologia de ponta um ouvido atento, uma voz bem colocada, uma dicção treinada e uma presença cativante.

A tecnologia veio abrir um mundo de possibilidades ampliando a capacidade de comunicação entre milhões de pessoas, por todas as camadas da nossa imensa torre de Babel. Em segundos conseguimos falar com o Brasil, Japão, Austrália e, desta forma, continuar a espalhar histórias de boca em boca, com outro tipo de tecnologia de ponta.

Como mestres contadores e ouvintes que somos (vejo-nos a nós portugueses assim, desta forma), sendo a palavra um bem precioso para nós, faz sentido que uma invenção da dimensão da Unbabel tenha nascido entre nós. 

A Unbabel veio ao mundo a doze mãos, com o Vasco Pedro, o Bruno Silva, a Sofia Pessanha, o Hugo Silva, o João Graça e o André Silva. A Unbabel é um serviço de tradução online que combina a já conhecida tradução automática (qual obsoleto google translator) com uma comunidade de pessoas espalhadas por todo o mundo. Máquina e Homem unem esforços para entregar traduções de forma simples e automática (por email, através de uma API, e em breve em aplicações criadas sobre os sites e produtos usados pelos próprios clientes).

O objectivo é fazer parte da criação de uma internet mais inclusiva e abrangente, onde o conteúdo está disponível e aberto a todos, independentemente de sua lingua nativa. O processo de tradução deixa de ser mais um passo, uma barreira e passa a fazer parte integrante do dia a dia, como quem vai ali contar mais uma história ao vizinho do lado.

Apesar da Unbabel ter nascido em Portugal e por portugueses, a equipa mudou-se de malas e bagagens, em Janeiro de 2014, para Silicon Valley nos EUA para poderem fazer parte de um sonho chamado Y Combinator onde todos os anos, milhares de StartUps de todo o mundo tentam entrar para poderem ser encubadas e se revelarem ao mundo.

A equipa considera estar a ter oportunidades que, em Portugal, nunca conseguiria ter. História muito comum e repetida do nosso país, criar para depois partir. Apesar disso, poderemos sempre dizer que, mais uma vez, conseguimos quebrar a barreira do lá fora e continuamos a espalhar palavras de origem portuguesa mundo fora.

(Texto: Raquel Félix – Portugalize.Me)