Talvez já aqui tenha falado de uma conversa que tive há uns três anos, recém-chegada ao Panamá, com um francês que trabalhava para uma empresa americana, nos mercados norte e centro-americanos.
Muito habituado a transitar entre os dois continentes, contava-nos que achava os franceses um povo invejoso. Dava-nos um exemplo da diferença da atitude dos seus concidadãos em relação à dos norte-americanos: um francês, ao ver uma pessoa a ter êxito, pensava que “algo deveriam ter feito”, ou seja, havia ali falcatrua. Já o americano tinha outra perspectiva: em vez da inveja, era competitivo, havia de fazer ainda melhor e ter ainda mais êxito.
Esta observação ficou comigo, acho-a brilhantemente sucinta muito aplicável a nós, portugueses.
(Generalizo, claro. Mas que levante o dedo quem nunca, nunca sentiu na pele o ferrão da inveja. Eu já.)
Mais ou menos ao mesmo tempo, li o fantástico livro “Inveja, mal secreto”, de Zuenir Ventura. Nele, o autor faz uma distinção que me parece muito importante: no ciúme, quem não tem e gostaria de ter reconhece que existe valor naquilo que o outro obteve (caso do americano). Na inveja, a história é outra: o invejoso retira o valor da coisa desejada ou do feito conseguido, e aí jaz o verdadeiro veneno. O invejoso diz que fulano teve êxito por uma qualquer razão obscura – e nunca pelo talento, trabalho, ou sentido de oportunidade.
Talvez pelo medo que temos do veneno dos invejosos, cresci sempre com esta sensação de que não devia sobressair. E por isso só dei conta deste mecanismo quando se tornou exagerado. Exemplo disso foi uma conversa há uns anos atrás, em que o meu interlocutor me aconselhou a não contar a ninguém que ia a Macau de férias. Fiquei siderada: depois de um ano inteiro a trabalhar e a poupar para pagar aquela viagem, não podia falar em algo que me dava tanta alegria?
É uma pena que nos consumamos tanto a proteger-nos de invejosos – e também, lamentavelmente, a invejar. Como dizem os anglófonos, “haters gonna hate”: os invejosos vão lá estar sempre, não há razão nenhuma para mudarmos o nosso comportamento só porque alguém pode não gostar do nosso êxito.
Para mim, contrariar esta aprendizagem tão interiorizada é um esforço: partilhar as minhas alegrias e os meus êxitos resulta-me difícil, por medo de ofender os outros. Uma parvoíce, não é? O mais importante a ter em conta é que as reacções dos invejosos só têm que ver com eles, não comigo. E por outro lado, não invejar também é um exercício. Almejemos, não invejemos.
E é por isso que gostava de vos convidar a partilhar algo de bom que vos tenha acontecido, algo que talvez até nem tenham contado a ninguém, com medo de ser mal entendido – ou invejado. Ou algo a que almejam, mas que ainda não conquistaram.
Porque as alegrias e os projectos devem ser partilhadas, apesar dos invejosos.
(Texto e imagem: Ana Isabel Ramos)