Hoje sinto-me desprovida de ideias e de palavras. Queria escrever algo optimista, ir resgatar qualquer coisa de positivo para aqui partilhar. Mas não consigo. Hoje, por telefone, uma amiga contava-me o seu desalento por sentir que em vez de melhorar o seu nível de vida, com o passar do tempo e a maior experiência profissional, a tendência no seu percurso era precisamente a inversa.
O assunto que hoje nos deixou assim, a mim, à minha amiga, e a tantos portugueses que se puseram a fazer contas à vida, foi a notícia dos aumentos nos escalões de IRS. Na minha opinião, são um verdadeiro atentado à dignidade e um forte incentivo à economia paralela. Parece-me francamente pornográfico considerar que alguém que tem um rendimento médio deve ser taxado como se fosse rico. O mesmo acontece nos escalões mais baixos: como podem rendimentos de sete mil euros anuais ser alvo de uma taxa impositiva de quase 25%? Como vivem essas pessoas?
Enquanto isso, ouvimos os disparates sobre que modelos de automóveis são apropriados ou não para os grupos parlamentares e seus líderes, como foi o caso de Carlos Zorrinho, líder parlamentar do Partido Socialista. Ou as relações obscuras entre empresas privadas e projectos públicos, caso da Tecnoforma e programa Foral. Não sentirão estas pessoas vergonha do que dizem e fazem? Da falta de transparência das suas acções? Onde está o bem público? Ou o exemplo que se quer que venha de cima?
Entendo o desespero e partilho-o; sinto que esta disparidade nos sacrifícios nos deixa desamparados. A isto acresce o facto de esta política de austeridade estar a paralisar toda a economia (excepto a paralela) e, em vez de estimular, esmaga a produção nacional, obrigando uma vasta franja da nossa população activa a emigrar. Este governo, actualmente tão preocupado com números e de idoneidade que começa a ser discutível, está a congelar um país, um país cheio de talento e de gente capaz.
Oxalá consigamos organizar-nos pacificamente para resistir e sair mais fortes, mais dinâmicos, mais poetas, mais alegres, mais unidos. Todos precisamos.
(Texto: Ana Isabel Ramos)