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Ontem ouvi notícias muito tristes sobre a possibilidade da calçada portuguesa passar apenas a figurar nas zonas turísticas da cidade de Lisboa. Razão? Diz-se que a dita calçada é uma barreira impeditiva da liberdade de idosos e de pessoas com mobilidade reduzida. Pensei que fossem os milhares de automóveis estacionados nos passeios que levassem a essa “falta de liberdade”?!

A culpa agora é da história, do que nos caracteriza e diferencia. A história não tem empresa, não cobra estacionamento, não é rentável. Os automóveis passam assim para o lugar da tradição. Lisboa, cidade da calçada portuguesa, vira Lisboa, cidade dos automóveis. Desconfio que este assunto ainda há-de fazer correr muita tinta, assim o espero, pois não desejo ver a calçada portuguesa num álbum Lisboa Desaparecida.

O que nos caracteriza não se deve perder.

Esta máxima aproxima-nos da nossa identidade e há muitas pessoas que estão atentas a isso. Reconhecem as especificidades do país, das gentes, das tradições. O olhar das mesmas valoriza e procura isso mesmo. Onde estão as nossas coisas, feitas coisas nossas? Não se vai à procura de Portugal onde ele não existe. Se o que nos caracteriza deixa de estar lá, no seu sítio, Portugal deixa de existir e passamos a ser uma outra coisa, uma espécie de China que prefere clonar cidades inteiras, na pretensão de se tornar mais ocidental, numa China menos chinesa.

Mas há pessoas que estão atentas a isso e procuram os sítios onde Portugal existe.

O que vos escrevo foi buscar inspiração à mensagem enviada de uma pessoa atenta, de uma portuguesa que até poderia ser uma inglesa, alemã, holandesa, chinesa, mexicana… ela refere-me um fim de semana que passou perto de Santiago do Cacém, não fala da experiência dela em si, mas do que viu, um turismo rural onde a cortiça e as madeiras são o ouro da casa. A Xana Frade é uma pessoa atenta e que tenta procurar Portugal onde ele existe para lhe dar mote, voz, para o poder falar. Para ela, Portugal é ir ao Monte do Giestal e perceber que ali se respeita e se preservam características do nosso país. No Monte diz-se que: “Cada casa tem um tema e uma história para contar!”… e pergunta-se: “Sabe o nome do fruto do sobreiro? Conhece o zambujo? Sabe para que serve a cortiça?”

A cortiça poderia ser facilmente substituída por outro material qualquer que desse menos trabalho a limpar. O pó que se mete pelas rugas da cortiça dá trabalho a tirar, exige mais de quem faz a limpeza, mas sem ela o Monte do Giestal não teria encanto nem histórias para contar.

(Imagem: Monte do Giestal/ Texto: Raquel Félix/ Portugalize.Me)