Já não sei em que ano estava, mas lembro-me do momento, por ser ainda estudante universitária e de fazer a viagem de comboio Lisboa/ Guarda, Guarda/ Lisboa vezes sem conta.
Adorava estas viagens de comboio, das partidas e dos regressos constantes, das bandas sonoras que compunham cada troço, das paisagens que iam ilustrando o andar da carruagem.
Sei que era uma tarde quente e das poucas vezes que ousei tirar os phones, o passageiro da frente perguntou-me de onde vinha, para onde ia, o que fazia. Variadas coisas que não me recordo ao certo. Sei que falamos um pouco e a dada altura falamos de Lisboa. O passageiro desconhecido era brasileiro e viajava por Portugal.
Ele não percebia o porquê dos lisboetas se incomodarem tanto com os prédios velhos e degradados da cidade. Isso era-lhe estranho, porque aquilo tinha um significado mais profundo do que a tinta desgastada ou uma parede caída. “Em Lisboa dá para sentir o tempo a passar. Os prédios velhos são o tempo que passa. Ali há história. O tempo fica ali, marcado.”
Não sei o que lhe respondi, apenas sei que nunca mais me esqueci do que me disse e que, a partir desse momento, passei a olhar para os prédios abandonados de Lisboa de uma forma mais poética, a tentar imaginar as histórias cravadas em cada fissura, em cada janela partida.
As coisas não são velhas, são o tempo que passa por elas.
(Texto e imagem: Raquel Félix/ Portugalize.Me)