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Lareira_Portugalize.Me

Tudo tem um cheiro associado. Eu creio que sim.

Desde pequena que cheiro tudo, era um movimento constante. Pegava numa maçã para comer, cheirava-a. Num pedaço de pão, cheirava-o. Passava as mão por uma superfície de madeira, cheirava-a. Lia um livro, nariz com ele (este ainda hoje o faço e com bastante frequência). Cheirava tudo. Tudo cheirava. Fosse comida, ou não, os cheiros chamavam a minha atenção.

Os odores contam histórias, sugerem-nos lugares, trazem imagens associadas, são coisas ricas, muito ricas quando lhes damos a devida atenção. Os cheiros não são só os cheiros, são um fio condutor, parte de algo que se desmultiplica à medida que procuramos o início e o fim da meada. Eles são evocação, palavra na ponta da língua quando esta se ausenta e nos deixa parte da memória a branco.

Os cheiros iniciam, complementam ou finalizam um enredo.

O cheiro a lareira veio agarrado a mim. É assim de cada vez que vou até à Beira. O frio intenso prende-nos à fogueira. À imagem da luz intensa das chamas associa-se o cheiro forte do fumo, da lenha e dos cozinhados ali grelhados. Uma chouriça, uma farinheira, parte do cabrito (porque a outra parte foi para guisar). E no pequeno espaço da cozinha concentram-se dezenas de odores que depois se agarram à lã da camisola, à ganga das calças, aos cabelos, às faces, às mãos.

O Natal na minha terra é um baralho de cheiros, todos eles familiares e que acabo por trazer para Lisboa como prenda que perdura por mais uns dias. A memória da reunião familiar fica mais viva assim.

Pondero lavar a roupa só daqui a uns dias para que possa recorrer a ela e mais facilmente conseguir regressar aos bons momentos de um jantar delícioso com os meus pais e a minha irmã. Assim fica mais tempo em mim e é reconfortante.

O cheiro do Natal veio preso a mim e ficará por aqui mais uns dias para depois lhe dizer: “até para o ano”.

Até para o ano e um bom 2015 cheio de bons e intensos cheiros.

(Texto e imagem: Raquel Félix – Portugalize.Me)